21 outubro 2006

Portagens nas SCUT: Condutores sem alternativa

Rafael Barbosa e Hugo Silva
Jornal de Notícias
[21.10.2006]



Portagens nas SCUT

Condutores sem alternativa

Uma viagem de automóvel entre a Póvoa de Varzim e o Porto demora mais do dobro do tempo se o condutor tiver de optar pela estrada nacional, em vez de auto-estrada.

No percurso entre o Porto e Estarreja pode demorar mais do triplo do tempo. O JN meteu-se no carro (páginas seguintes) e concluiu que as premissas de tempo apontadas pelo Governo para a colocação de portagens nas auto-estradas SCUT do Litoral Norte não foram totalmente cumpridas.

Quando o ministro das Obras Públicas anunciou a colocação de portagens nas três SCUT que convergem para o Porto (Costa de Prata, Norte Litoral e Grande Porto) esclareceu que a decisão se baseou em critérios técnicos.

O primeiro impõe que o Produto Interno Bruto (PIB) per capita do conjunto de concelhos afectados não ultrapasse 80%.

O segundo, que o mesmo conjunto de concelhos tenha um poder de compra per capita acima de 90% da média nacional.

O terceiro critério é de que o tempo gasto no percurso pelas estradas alternativas não superasse em 1,3 vezes o tempo gasto nas auto-estradas.

Sendo que o Ministério esclareceu, entretanto, que o índice representa, afinal, 2,3 vezes o tempo gasto nas auto-estradas.

Foi este terceiro critério que o JN foi testar, para concluir que é ultrapassado, mesmo se interpretado na sua versão mais "generosa" (2,3). O melhor que conseguimos, apenas uma vez, foi demorar o dobro do tempo.

A regra foi mesmo gastar mais do dobro e até o triplo do tempo em estrada nacional do que na auto-estrada.

Anteontem, ao final da tarde, foram feitas quatro viagens a partir do centro do Porto duas para Estarreja, duas para a Póvoa de Varzim.

Ontem de manhã, efectuaram-se os percursos inversos. Se as entradas e as saídas da cidade constituem obstáculos comuns, o tempo que se perde nos trajectos parciais (aqueles onde, de facto, terá de fazer-se a opção pelas auto-estradas ou não, ou seja, por pagar ou não portagem) é revelador das carências das vias alternativas.

Por exemplo, ao final da tarde de anteontem, entre os nós de Arcozelo e de Estarreja da A29, quem seguiu pela auto-estrada gastou 17 minutos.

Quem quis "fugir" às portagens e seguiu pela EN109, gastou, entre os mesmos dois pontos, 55 minutos. Feitas as contas 3,2 vezes mais pela estrada nacional do que pela auto-estrada.

Ao princípio da manhã de ontem, as mesmas pessoas fizeram o percurso inverso. A automobilista que seguiu pela EN109, gastou, entre os mesmos dois nós, 59 minutos.

O percurso pela A29 foi bastante mais demorado do que na véspera, gastando-se 30 minutos. Resultado, o índice foi de 1,96.

No percurso entre o Porto e a Póvoa, a escolha entre seguir por auto-estrada e pagar portagem, ou por estrada nacional, obriga a percursos completamente diferentes e a diferenças de tempo assinaláveis entre os nós de Francos (na VCI) e da Póvoa, pela A28, foram necessários 21 minutos, ao final da tarde de anteontem.

Pela EN 13, entre o nó do Regado (também na VCI) e o centro da Póvoa, gastámos 58 minutos.

Ou seja, seguir pela estrada poderá ser mais barato em euros (poupa-se na portagem), mas mais caro 2,76 vezes no tempo que se gasta.

Para entrar no Porto, na manhã seguinte, a diferença foi ligeiramente inferior.

Optar pela A28 e percorrer a distância entre os nós da Póvoa e de Francos custa 31 minutos.

Pela EN 13, entre o centro da Póvoa e o nó do Regado, gastámosuma hora e nove minutos para chegar à Invicta. Um índice de 2,22 (o limite é 2,3).

Uma questão de númerosUm dos critérios definidos pelo Governo para introduzir portagens nas SCUT prende-se com o facto de os automobilistas disporem de uma alternativa que permita fazer o mesmo percurso num tempo máximo de até 1,3 vezes.

Quer o Governo dizer com isto que o tempo a levar numa alternativa pode ir até mais 130% do que numa SCUT, e não 30%.

Questionada pelo JN sobre a questão dos 1,3 vezes e dos 30%, e garantindo que tudo foi devidamente explicado na conferência de imprensa, fonte oficial do Ministério das Obras Públicas frisou que o acréscimo será de até 130% (e não 30%).

Por exemplo, se na SCUT que nos leva até Viana do Castelo demoramos 60 minutos, quer com isto dizer que na alternativa poderemos demorar até 138 minutos, ou seja, até 2 horas e 18 minutos.

Isto é, 60 minutos a multiplicar por 2,3 vezes. O documento disponibilizado pelo Ministério aos jornalistas refere "Foi assumido um índice de referência de 1,3 vezes (...)".JA

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