15 outubro 2006

PDM de Viana é "propício" a "discricionariedades"

Ana Peixoto Fernandes
Público
[15.10.2006]


Arquitecto Pulido Valente e ex-vereador do Urbanismo da Câmara do Porto apontam o dedo à nova versão do documentoMal escrito, assente em conceitos de arquitectura inadmissíveis, susceptível de criar uma cidade "monótona", propício ao livre arbítrio e a discricionariedades.

Extenso, com demasiadas regras, mas com excepções que o tornam pouco transparente e enleado em secretismo. Assim foi classificada a proposta de revisão do Plano Director Municipal (PDM) de Viana do Castelo, que actualmente se encontra em consulta pública, pelo arquitecto Pulido Valente e pelo ex-vereador do Urbanismo da Câmara do Porto, Paulo Morais, que ontem foram convidados a debater o documento numa sessão pública organizada pela Comissão Política Concelhia do PSD local.

"Está muito mal escrito, tem erros culturais gravíssimos e assenta em conceitos inadmissíveis, como a ideia de que os edifícios têm de parecer paralelepípedos", declarou o arquitecto Pulido Valente, autor de projectos como os edifícios da Axa na cidade do Porto ou dos Paços do Concelho de Barcelos.

Notou ainda que, de acordo com a segunda geração do PDM de Viana, "as casas têm de estar todas alinhadas em frente da rua e, para estar assim e para cumprir com as cérceas que eles ali impõem, automaticamente está-se a definir um paralelipípedo e a liberdade de criação dos arquitectos morre aí".

"Portanto, cria-se o deserto e torna-se uma cidade muito monótona e chata. É o que se vai criar. Já está criada, aliás, há muitos anos", avaliou, vincando que o plano é, na sua óptica, "propício ao livre arbítrio e a discricionariedades"."O país está a suicidar-se lentamente", diz Morais.

Na mesma linha de pensamento, o ex-vice-presidente da Câmara do Porto Paulo Morais não poupou a nova proposta de PDM para Viana. "Li o regulamento e vejo que é muito extenso, tem muitas regras que permitem que o cidadão esteja ao abrigo de uma arbitrariedade permanente por parte da câmara, ou seja, com ele a autarquia pode proibir quase tudo", considerou, acrescentando que o plano "tem curiosamente também muitas excepções que permitem que a câmara venha a permitir o que quiser".

Além disso, continuou, "está imbuído de um grande carácter de discricionariedade e, naturalmente, aqui, como infelizmente acontece em todo o país, há uma fúria imobiliária especulativa crescente". "Os PDM estão a caminhar neste sentido, o que é lamentável para o país, que está cada vez mais cheio e está, em termos de urbanismo e património, a suicidar-se lentamente", acusou.

Ainda no que concerne ao plano em análise no debate de ontem, onde também estiveram presentes o urbanista Diogo Alpendurada e o vice-presidente e vereador do Urbanismo da Câmara de Barcelos Manuel Marinho (ver caixa), Morais frisou um aspecto que considera dever ser esclarecido pela autarquia vianense em nome da "transparência": "Vejo que há algumas zonas que passam de Reserva Agrícola para zona urbanizável e seria bom que a câmara explicasse muito bem por que motivo pega em terrenos que estão qualificados enquanto zona de Reserva Agrícola e permite a sua urbanização", desafiou.

"Aqui, em Viana, temos um documento extenso, muitas regras, muitas excepções, muita discricionariedade no articulado do regulamento, e isto, inevitavelmente, leva a um documento que não é tão transparente quanto se gostaria.

Não bastasse isso, o próprio processo de discussão do PDM, com excepção desta sessão de hoje, tem sido feito com algum secretismo", concluiu.

O vice-presidente da Câmara de Barcelos e antigo funcionário da Câmara de Viana, Manuel Marinho, criticou ontem o facto "imperdoável" de a cartografia subjacente à proposta de PDM em discussão pública estar "desactualizada", tendo já cerca de dez anos.

Na mesma senda, revelou que "há muitas queixas de muitos erros [contidos no plano] em relação à localização de linhas de água, o que vai custar muitos problemas no futuro", e também que "muitos loteamentos com alvará emitido foram ignorados". "Passaram por cima deles e agora são zonas de não construção", alertou.

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