22 outubro 2006

DE MÃOS NOS BOLSOS À ESPERA QUE A PONTE REABRA

Ana Peixoto Fernandes
Jornal Público
[22.10.2006]



O encerramento para obras da ponte de Eiffel de Viana do Castelo fez estagnar todos os sectores de actividade comercial na margem esquerda do rio Lima.

Comerciantes temem pelo futuro, já que as obras devem durar pelo menos mais um ano.

As mãos nos bolsos e o sorriso desmaiado de José Pujol, de 44 anos, 12 dos quais dedicados a abastecer viaturas num posto de combustíveis situado em Darque, a escassos metros da velha ponte metálica sobre o rio Lima, em Viana do Castelo, revelam o que é evidente para a esmagadora maioria dos comerciantes da freguesia: o encerramento da travessia para obras há quase nove meses provocou a estagnação do negócio, quase sem excepção.

Ausência de movimento, quebras de 30, 50 e até 70 por cento na facturação, descidas de preços e dispensa de pessoal para fazer face às provações são algumas das consequências mais visíveis.

O desvio para a A28 do grande fluxo de trânsito que "alimentava" a pequena vila a partir da cidade de Viana, via Estrada Nacional n.º 13, obriga os automobilistas a efectuar o triplo da distância para se movimentarem entre as duas margens. E Pujol passou a abastecer "menos 50 por cento" de clientela.

"Antigamente, estávamos sempre a trabalhar e agora estamos de mãos nos bolsos. Há horas em que podíamos fechar a bomba", admitiu ao PÚBLICO, olhando a estrada vazia à sua frente. E continua: "Só trabalhamos com a gente da freguesia. É um caos. Todos os comércios baixaram.

Não há movimento, não há vendas, não há dinheiro...".


Restaurante baixou preço das diárias

Na zona do Cabedelo, o bar-restaurante Aquário está vazio, numa segunda-feira.

"Hoje, a esta hora [15h00] era dia de ter casa cheia e neste momento temos uma mesa lá atrás" queixa-se Ricardo Pinto, de 26 anos, ex-funcionário e agora proprietário do estabelecimento.

Há dois meses, "talvez por causa da quebra sofrida", atira, os antigos patrões passaram-lhe o negócio, mas Ricardo viu-se obrigado a adoptar medidas drásticas: reduziu o número de funcionários "de cinco para três" e baixou o preço médio das diárias "de 5,5 euros para 3,5 euros".

"Como empregado, tenho noção do que se fazia (em termos de movimento de clientes) e agora é muito menos de metade", revela, arriscando a avaliar as quebras sentidas na facturação em "70 por cento".

A escassos metros no Foz Caffé, estabelecimento de restauração da mesma linha do anterior, o cenário repete-se. A gerência (o responsável pediu para não ser identificado) viu-se obrigada a, desde o encerramento da ponte em Fevereiro deste ano, dispensar oito funcionários por falta de movimento.

"Passámos de 20 para 12. Dispensamos o pessoal extra e ficamos com o fixo", declarou o gerente ao PÚBLICO, vincando que, por causa do fecho da travessia situada a pouco mais de um quilómetro, a casa sofreu "uma quebra entre 60 e 70 por cento".

Antevendo que o problema está para durar - Setembro de 2007 foi o prazo estabelecido pelo Governo para a conclusão das obras na ponte -, defende que "são precisos incentivos para combater esta fraqueza".


Loja de instrumentos vira-se para a Internet

Maria Celeste Moreira, de 77 anos, proprietária da cadeia de Padarias Cais Novo, em Darque, abana a cabeça quando lhe perguntam pelo impacte do encerramento da travessia no negócio. "Sentimos muito. Estamos muito mal porque, para distribuir o pão, as nossas cinco furgonetas têm de dar uma volta muito grande.

Antes eram dois quilómetros, agora são para aí uns trinta", queixa-se, frisando: "Temos mais gastos com o combustível, com o pessoal que tem de vir trabalhar mais cedo para termos o pão a horas nos sítios e estamos a fazer menos negócio".

No quiosque Solitário, o filho do proprietário Antonino Baptista, de 26 anos, diz estar "com o irmão a tentar convencer o pai a fechar".

"A venda de jornais e revistas caiu para menos de metade. Os desportivos antes vinham aos 60, agora vêm aos 20, e os diários também. Só vendemos ao pessoal do bairro e um bocadito ao fim-de-semana", justifica, enquanto arruma as "devoluções".

"Às vezes não tenho espaço aqui, tenho de as levar para um armazém", comenta. Amadeu Palhares, de 36 anos, viu a sua loja de instrumentos musicais/escola de música, situada no centro de Darque, perder "de um dia para o outro quando fechou a ponte" o seu movimento constante.

"Antes tinha um trânsito de gente quase contínuo, agora não, é por fases", refere, avaliando as perdas nas vendas em cerca de 40 por cento.

"No mês de Janeiro facturei 27 mil euros e em Fevereiro, primeiro mês do encerramento da ponte, sete mil", revela, acrescentando que para superar os danos adoptou uma "atitude pró-activa", criando um site na Internet, um outlet e apostando em "packs promocionais".


Duas lojas do ramo alimentar "cresceram" no meio da crise


A Associação Empresarial de Viana do Castelo (AEVC) efectuou recentemente um estudo sobre o impacte do encerramento da Ponte Eiffel em cerca de 80 empresas de Darque, no qual verificou que, no geral, as perdas se fixam em média nos "45 a 55 por cento".

Por sectores de actividade, o dos serviços sofreu uma quebra de cerca de 30 por cento enquanto que a da restauração chega aos 70 por cento. A crise afecta a todos, menos dois estabelecimentos.

"No meio desta miséria toda, há duas lojas do ramo alimentar que cresceram, porque passaram a vender mais", revelou ao PÚBLICO o presidente da AEVC, Joaquim Ribeiro, explicando que se trata de espaços que vendem produtos "muito específicos" a preços competitivos.

O cenário é, de resto, negro para o tecido comercial também da margem direita do rio Lima, principalmente para cafés e pastelarias situados junto à ponte do lado da cidade.

"Há perdas de 50 por cento e o pior ainda está para vir para todos, porque, até agora, ainda havia o turista...", conclui.

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